Deputado Nelito Ekuikui disse ter sido agredido pela polícia angolana, este sábado numa manifestação em Luanda, e estimou que cerca de 40 jovens que participavam no protesto terão sido detidos.
Em declarações à agência Lusa, Nelito Ekuikui disse não ter havido nenhuma razão que justificasse a agressão e afirma ter sido retido durante cerca de uma hora, acusando as autoridades de “uso excessivo da força” e de estarem a cometer uma ilegalidade.
“Disseram que a manifestação não pode ocorrer porque viola o decreto presidencial [que atualiza a situação de calamidade pública e entrou em vigor este sábado], mas estão a violar a Constituição”, afirmou o deputado da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), maior partido da oposição, recordando que ele próprio foi legislador da lei de proteção civil, que não contempla a suspensão de direitos como os de manifestação.
“Claramente, este decreto foi forjado para impedir a manifestação”, acusou Nelito Ekuikui, criticando a presença das forças armadas nas ruas de Luanda e aconselhando o Governo a recorrer ao diálogo porque os protestos “não vão parar”.
Também Ginga Sakaita Savimbi, filha do fundador do partido, Jonas Savimbi, que estava ao lado de Nelito Ekuikui, na altura em que este foi agredido, disse à Lusa que não houve explicações por parte da polícia.
“Estamos no Santa Ana, com um absurdo aparato policial para uma manifestação paciífica. Agrediram um deputado que veio manifestar-se pacificamente”, afirmou, acusando o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, partido no poder) de ser “um regime fascista”.
“[A polícia] diz que não podemos manifestar-nos, mas a manifestação foi aceite e agora dizem que não pode, porquê”, questionou Ginga Savimbi.
Feridos e detidos
O deputado Nelito Ekuikui afirmou também que um dos organizadores da manifestação, o ativista Dito Dali, foi ferido e teve de receber assistência hospitalar, tendo sido detidos “cerca de 40 jovens”, entre os quais o presidente do Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA), Francisco Teixeira.
A Lusa procurou obter esclarecimentos adicionais e confirmação das detenções junto à polícia de Luanda, que remeteu informações para mais tarde.
A marcha deste sábado, convocada por ativistas da sociedade civil, mas que contou com a adesão da UNITA e outras forças da oposição, visa reivindicar melhores condições de vida, mais emprego e a realização das primeiras eleições autárquicas em Angola, que estavam previstas para este ano e foram adiadas sem nova data.
Direito constitucional
Mais cedo, o presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, já havia criticado a agressão do deputado Nelito Ekuikui pela polícia e lamentou que o Governo angolano esteja a tentar impedir manifestações por estar “em pânico”.
“Bastou chegar ao local e o deputado foi agredido pela polícia com porretes”, disse à Lusa, afirmando que o cemitério de Santa Ana, ponto de concentração da manifestação prevista para hoje, apresentava às 11 horas locais um “forte aparato policial”, com cavalaria e brigadas caninas.
Adalberto da Costa Júnior salientou que a tentativa de impedir a manifestação é “uma absoluta ilegalidade”, já que foi aprovada em maio uma lei que “dá cobertura à situação de calamidade e não prevê que sejam suspensos os direitos fundamentais dos cidadãos, nomeadamente o direito à manifestação”.
“Em circunstância alguma podem ser violados direitos constitucionais dos cidadãos. Para tal teria de haver um regresso ao estado de emergência”, realçou.
Voltar para casa
Na sexta-feira (23.10) à noite, o Governo anunciou novas medidas, mais restritivas, para a situação de calamidade, face ao aumento do número de casos de Covid-19 em Angola.
Entre estas, estão as limitações de ajuntamentos na via pública até cinco pessoas. Foi também alterado um artigo relativo ao distanciamento físico entre os participantes de atividade e reuniões realizadas em espaço aberto, que contemplava manifestações no anterior decreto, possibilidade que foi retirada no novo diploma que entrou em vigor este sábado.
“Esta é uma circunstância de um Governo impopular que faz um ‘marketing’ extremo. Bastou dizer que a UNITA ia aderir à manifestação para ter uma resposta diferente”, criticou Adalberto da Costa Júnior, assinalando que as anteriores quatro manifestações foram realizadas sem problema de maior.
Segundo o dirigente do “Galo Negro”, “o Governo entrou em pânico, João Lourenço não respeita o Estado de Direito e a Constituição do país”.
“Por isso, estamos a dizer para voltarem para casa, não queremos confrontos e não queremos ninguém ferido”, acrescentou, salientando que houve “movimentação de tanques na noite anterior e foram colocadas barreiras de polícias e militares para impedir movimentações nos bairros e nos acessos a Luanda”.